Marcha atrás de Itália na nova lei sobre violência sexual gera indignação

  • 27/11/2025

 

 

Na semana passada, a 19 de novembro, a Câmara dos Deputados aprovou por unanimidade um projeto de lei que torna mais rigorosa a definição de violência sexual, num invulgar acordo entre o partido Irmãos de Itália (pós-fascista), da primeira-ministra Giorgia Meloni, e o Partido Democrático (PD), principal força da oposição, de centro-esquerda, liderado também por uma mulher, Elly Schlein.

A aprovação, com 227 votos a favor e nenhum contra, na câmara baixa do parlamento, fazia prever um adoção sem sobressaltos no Senado, que os partidos do centro-esquerda desejavam que tivesse tido lugar a 25 de novembro, por ocasião do Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres, mas a votação foi adiada depois de o vice-primeiro-ministro Matteo Salvini, líder do partido de direita radical Liga -- que integra o Governo juntamente com os Irmãos de Itália e a Força Itália (direita) -, solicitar uma pausa para "mais debate".

De acordo com Salvini, a nova legislação, que redefine o estupro de forma que o consentimento seja necessário em todos os momentos de uma relação sexual, "deixa demasiado espaço para a interpretação individual", ainda que "o princípio do consentimento seja algo com que se pode concordar absolutamente".

"É uma lei que corre o risco de entupir os tribunais e alimentar conflitos, em vez de reduzir a violência. Este tipo de consentimento preliminar, informado e atual, tal como está escrito, deixa margem para que mulheres e homens utilizem uma lei vaga para vinganças pessoais, sem que tenha ocorrido qualquer abuso", argumenta Salvini, que defende assim mais debate.

Os argumentos de Salvini já foram rebatidos tanto pelos partidos da oposição -- que abandonaram a audiência da comissão de Justiça do Senado sobre o projeto de lei assim que tomaram conhecimento da suspensão da sua aprovação -, como por vários juristas e associações de defesa dos direitos das mulheres em Itália.

Apesar de a presidente da comissão de Justiça do Senado já ter garantido que um projeto de lei estará pronto na fase de comissão em janeiro e deverá ser aprovado em fevereiro, esta 'marcha atrás' da coligação governamental tem merecido o repúdio dos partidos da oposição, com a deputada Laura Boldrini (PD), autora do texto de lei aprovado na semana passada na câmara baixa, a acusar Meloni de "trair" o compromisso assumido com Schlein e a lamentar que as mulheres sejam vítimas de 'guerras' internas entre os partidos do Governo, agudizadas por recentes eleições regionais.

"A Liga quis vingar-se da primeira-ministra à custa das mulheres. O que aconteceu faz pensar numa manobra interna. Fizeram isso por causa das suas tensões internas, é uma forma de colocar a primeira-ministra em dificuldades e fazê-la perder a face", disse Boldrini, referindo-se às frequentes 'quezílias' entre Salvini e Meloni, cujos partidos disputam sensivelmente o mesmo eleitorado.

Ainda segundo a deputada, "é muito grave da parte da primeira-ministra não ter cumprido um acordo feito com a secretária do PD, Elly Schlein", como resultado de "uma reviravolta vergonhosa induzida pela Liga, que agiu de forma imprudente", alegando que há inversão do ónus da prova, quando "nenhum magistrado, nenhum jurista poderá jamais dizer isso".

"Não será a mulher que terá de demonstrar o seu desacordo, através de uma reação, gritos e resistência, porque, como afirmam centenas de estudos, o medo pode imobilizar, petrificar a vítima. Todos os juristas ouvidos na audiência afirmaram que esta norma é necessária, é civilizada e já foi adotada por 21 países europeus. A maioria permite-se procurar essas desculpas que não existem para encobrir problemas internos e uma recusa cultural em proteger as mulheres", afirmou.

Também a deputada Elisabetta Piccolotti, da Aliança Verde e Esquerda, considera que "está em curso um acerto de contas entre Salvini e Meloni à custa das vítimas".

Quanto às dúvidas legais suscitadas por Salvini, também a advogada e especialista em violência de género Teresa Manente, chefe da equipa jurídica da Associação Diferença Mulher - de defesa dos direitos das mulheres e luta contra a violência de género -- acusa o líder da Liga de "não conhecer o processo penal", pois "nem pensar que há inversão do ónus da prova".

"Absolutamente não. É um erro jurídico. Exatamente como acontece hoje em dia nos processos penais por violação, haverá uma mulher que alega ter sido violada e um arguido que defende que o ato foi consensual. Mas será sempre o Ministério Público, e não o arguido, que terá de provar se essa relação foi ou não livre e voluntária", explicou, em declarações ao jornal La Repubblica.

Sobre o argumento de Salvini de que esta nova lei abre espaço para "vinganças pessoais", a advogada diz que "gostaria de saber quantas são e, se Salvini tem os números, que os mostre", manifestando-se convicta de que "esses números não existem porque se trata de percentagens insignificantes, se é que existem".

"Defendi centenas de mulheres e nunca me deparei com uma denúncia por violência não comprovada por factos. Evidentemente, o ministro dos Transportes [Salvini] não sabe o que significa para uma mulher enfrentar um processo por violação. Chama-se calvário. Hoje, estamos perante o drama oposto: as vítimas não denunciam para não terem de enfrentar o processo".

A advogada explica que a diferença que a nova lei introduz é que "a falta de consentimento não terá mais de ser demonstrada através da 'resistência' da mulher, que talvez não tenha fugido, não tenha gritado ou não tenha ferimentos", já que muitas vítimas de violação ficam "imobilizadas como se estivessem congeladas, com medo de morrer, para tentar não sentir o horror", uma síndrome bem conhecida e documentada.

A atualização do código penal, que fica assim em suspenso pelo menos até fevereiro, surge na sequência de várias sentenças controversas proferidas nos últimos anos em casos de violação que suscitaram indignação a nível nacional.

Para prevenir polémicas decisões judiciais de absolvição de suspeitos de violação, a nova lei revista, sem agravar as penas, que continuam a ser entre seis e 12 anos de prisão, amplia a definição de violação, facilita a denúncia e o julgamento de agressões sexuais, eliminando a obrigação de as vítimas apresentarem sinais físicos de abuso.

Leia Também: Portugal e Itália assinam declaração conjunta antes de compra de fragatas

FONTE: https://www.noticiasaominuto.com/mundo/2895661/marcha-atras-de-italia-na-nova-lei-sobre-violencia-sexual-gera-indignacao#utm_source=rss-mundo&utm_medium=rss&utm_campaign=rssfeed


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